quarta-feira, 12 de maio de 2010

Interessante...


Vamos refletir? Pensar? Conhecer um pouco mais sobre...? Escolhi esse texto (muito bom) do Diretor Alexandre Matte

Um olhar sobre a história e o fazer teatral

Antes da História, um pouco de histórias.

Muitas pessoas, pelos mais diversos motivos, não tiveram ainda a oportunidade de ir ao teatro para assistir a um espetáculo. Apesar disso, é certo que, de um modo ou de outro, todo mundo entende um pouco de Teatro, seja por peças feitas ou assistidas na escola, por entrevistas em que atores falam dessa arte ou de seu trabalho como intérpretes, ou por uma certa aproximação da linguagem teatral com aquela dos filmes ou das telenovelas. A essência do Teatro, que compreende o autor, o texto e o público, acontece no chamado fenômeno teatral, ou seja, o espetáculo. Por sua vez, o espetáculo é uma arte do aqui-agora porque ele só acontece, de verdade, com a presença, ao vivo, do ator e do público. Diferentemente de outras formas artísticas ligadas às chamadas artes da representação – como, por exemplo, aquelas praticadas por atores no cinema e na televisão –, no Teatro, quando atores e público estão juntos em seus espaços característicos – o palco e a platéia –, diz-se que ambos participam de uma experiência artística ou estética. Essa experiência estética, por suas características particulares, assume uma forma ritualística. O Teatro, pela relação atores-público, representa uma espécie de cerimônia simbólica. Portanto, o público e os atores sabem-se separados, pelas funções diferentes, mas ligados pela mesma experiência, que é o espetáculo. Em Teatro, tudo se passa ao mesmo tempo. Quando, por exemplo, um ator erra ou esquece o texto, quando um refletor de luz não funciona, quando um ator tem um “ataque de riso” imprevisto, quando a trilha sonora não entra no momento certo não há como corrigir o imprevisto. Não é possível voltar atrás. Nesses momentos, cabe ao ator improvisar e assumir aquilo que não estava previsto ou disfarçar e fingir que nada aconteceu. No primeiro caso, quando se improvisa, é bastante comum acontecerem momentos memoráveis de cumplicidade na parceria atores/público. Ao aproveitar-se do erro, o ator pode brincar e estimular de modo mais efetivo a participação do público. Afinal, Teatro é um jogo entre o público e os atores. No espetáculo teatral, quando um problema aparece e o ator assume o “erro”, o público normalmente compreende e incentiva ainda mais os atores com palmas. Quando o espetáculo é bom e tudo funciona, o público se entrega a ele. Há uma atmosfera de respeito e silêncio, de total aceitação. É como se o público e os atores “respirassem juntos”.

As origens e a natureza do Teatro

O Teatro, na condição de linguagem sistematizada, iniciou-se na Grécia Antiga (por volta do séc. VIII a.C.) como decorrência de cerimônias ou rituais religiosos em homenagem ao deus Dioniso (ou Bacco, para os romanos), que teria ensinado a humanidade a cultivar uvas e a fazer vinho. O ritual em homenagem ao deus Dioniso chamava-se “Ritual de Fertilidade” e estruturava-se em uma procissão, com vários seguidores, cujo símbolo era o phallos (pênis). Desse modo, o deus – hoje considerado o patrono do Teatro – era tido como fertilizador das vinhas, da terra e da humanidade e, como conseqüência, dos prazeres carnais. Nesses rituais, personificar o deus (“estar em seu lugar”) para homenageá-lo correspondia à aceitação do princípio do fingimento, que caracteriza até hoje a base do trabalho do ator. Assim, o princípio de “aceitar” o ator como sendo a personagem é uma “convenção de natureza estética”. Quando se assiste a um espetáculo teatral, alguma coisa nele, que nem sempre se consegue explicar, pode provocar as mais diferentes reações. Palavras não compreendidas, gestos emocionantes, movimentos inexplicáveis, pessoas estranhas, imagens poéticas, e o contrário disso tudo, podem mexer com as pessoas. A apreciação estética compreende, então, uma reflexão sobre os sentimentos provocados pelo belo artístico. O poeta português Fernando Pessoa escreveu, na década de 30, um de seus poemas mais famosos, chamado “Autopsicografia”, cujos versos, a respeito de fingimento, dizem:
O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente
Sabe-se que um determinado ator não é a personagem que apresenta ou aparenta ser; entretanto, dependendo do talento ou da capacidade para metamorfosear-se nessa personagem, o ator pode levar o espectador a acreditar, a torcer, a ter raiva, pena, a refletir, enfim, a identificar-se com ela. Em Teatro, diz-se ainda que essa identificação com a personagem – que também pode ser chamada de empatia – tanto pode ser emocional quanto racional ou, como acontece normalmente, compreender os dois tipos de aproximação. Em grego, a palavra persona significa máscara; vêm daí palavras como personalidade e personagem. Desse modo, a personagem corresponde a uma máscara, seja no sentido de mentalidade ou conjunto de características comportamentais de alguém, como também o próprio objeto que, na Grécia Antiga, era usado pelos atores. É por isso que o símbolo do teatro é representado pelas duas máscaras: a da tragédia e a da comédia.

Nem verdade, nem mentira, apenas verdade simbólica

Que estranho e desconhecido procedimento é esse que, nas artes da representação, faz com que se acredite em alguma coisa que se sabe não verdadeira? O que faz com que se torça por esta ou aquela personagem a ponto de sentir suas dores, receios, raivas, inquietações? Que espécie de emoção é essa que nos induz a esquecermos de nós mesmos para emocionalmente nos colocarmos no lugar dos outros? Por que se torce, sofre, chora, tem raiva, quer vingança, se emociona pelas personagens que sabemos não serem reais? O que faz com que se “sinta de verdade” – emocional e racionalmente – os sentimentos das personagens? Que coisa é essa? Sabe-se que a arte da representação não mostra a “realidade verdadeira”, mas a imita e, em boa parte das vezes, com tanta semelhança que se confunde o verdadeiro com o imaginário. A “confusão” entre realidade e ficção acontece porque em arte impera o conceito de verdade simbólica ou realidade simbólica. Ou seja, sabe-se que não se trata de uma verdade, mas aceita-se como se representada o fosse. Ou melhor, aceita-se a “verdade” a partir de uma convenção. Nessa “realidade simbólica”, fundamentada no fingir, concentra-se talvez a grande força da arte teatral: o ser humano precisa ser mais do que ele mesmo, precisa superar-se a partir de histórias e trajetórias de outros seres, precisa identificar-se com a personagem-modelo, talvez até para entender-se melhor, conhecer-se melhor, colocar-se no lugar do outro, ser aceito.

O surgimento da palavra Teatro

De certo modo, o poder encantatório que o teatro tem exercido na humanidade apresenta-se na própria raiz da palavra grega, ou seja, o nome teatro vem de theastai ou theatron: “lugar de onde se vê”, que corresponde à área da platéia. Com o passar dos tempos, a expressão passaria a designar não apenas um local como também o espetáculo e sua linguagem específica. Dentre os autores consagrados do período da antigüidade, cujas obras até hoje nos emocionam ao mostrarem a fragilidade humana diante do destino, podem ser destacados os autores de tragédias Ésquilo (525-456 a.C.), Sófocles (496-406 a.C.) e Eurípedes (480-406 a.C.), e de comédias Aristófanes (445-386 a.C.) e Menandro (342-292a.C.). Nos dias de hoje, a palavra Teatro tem várias conotações. Fala-se, por exemplo, Teatro Municipal – referindo-se à casa de espetáculos; Teatro de Ariano Suassuna – referindo-se ao conjunto de obras criadas pelo autor; Teatro de Antunes Filho – correspondendo ao conjunto de espetáculos dirigidos pelo diretor; Teatro de Fernanda Montenegro – correspondendo ao modo de interpretação da atriz. Diz-se, ainda, que um determinado filme é bastante teatral – identificando-se as características próprias do teatro presentes na obra, ou que um determinado espetáculo tem muita teatralidade – referindo-se, normalmente, ao jogo dos atores em cumplicidade com a platéia.
Para se avaliar um espetáculo teatral, pode ser um bom critério ficar bastante atento ao desempenho dos atores, observando se imitam ou levam para o palco características consagradas pelos programas ou atores de televisão. Principalmente nas comédias, não é difícil encontrar atores que apelam para os tipos televisivos. Teatro não é televisão! Uma imitação dessa natureza, além de empobrecedora, acaba perdendo a teatralidade. Uma avaliação positiva pode ser feita quando o ator imita esses tipos televisivos para criticá-los. Ao se fazer Teatro na escola ou na comunidade, deve-se fugir dessas imitações. Deve-se ter claro que a capacidade imaginativa do ator é infinitamente superior àquela da simples imitação. Pode ser difícil de entender, mas, quando se imita uma dessas personagens, não só os gestos exteriores são copiados como também todo tipo de preconceito que ela carrega. Um excelente resultado pode ser obtido quando se leva essa discussão para a sala de aula. Algumas questões podem dar início ao debate: quais são os tipos de interesses existentes na criação de determinadas personagens preconceituosas? Por que, por exemplo, a classe média acha tão “engraçado” as falas e posturas de personagens que dizem detestar pobre? É até “compreensível” que a classe média ria, mas, e o pobre? Do que é que ele ri? Fala-se tanto em democracia grega, mas os gregos consideravam as crianças, os escravos, os estrangeiros e as mulheres, seres inferiores. Além disso, as mulheres não podiam atuar nos palcos – eram os homens que faziam os papéis femininos – e nem podiam assistir às comédias. Isso porque, segundo a “lógica do período”, a comédia era considerada inferior à tragédia, o que também é um preconceito. A mulher, que era considerada inferior, não podia assistir a “obras inferiores”. O Teatro foi utilizado pelo Estado grego como celebração de caráter cívico e religioso com o objetivo de “educar” – no duplo sentido da palavra, ou seja, doutrinar e transmitir conhecimentos aos espíritos e sensibilizar os cidadãos. Das formas ritualísticas em homenagem aos deuses, os governantes passaram a incentivar e a obrigar os cidadãos a freqüentarem os imensos teatros construídos para que assistissem às tragédias. Criaram, também, os grandes festivais de teatro, que davam prêmios e prestígio aos autores teatrais. Naturalmente, nesse período só eram selecionadas obras interessantes ao Estado, que não se opunham aos valores defendidos por ele. A produção popular jamais recebeu qualquer tipo de apoio e, sem exagero, acabou sendo “expatriada” pelo Estado. Depois de assistir a uma tragédia, os espectadores saíam dos teatros como que purificados, aliviados espiritualmente; algo parecido com o tipo de conforto que religiosos têm quando acompanham um culto, por exemplo. Esse estado de vivência emocional ou de limpeza interior chamava-se catarse (do grego khatarsis) e, modernamente, como já apresentado, corresponde à empatia ou identificação. Ao longo de quase toda a história, o Teatro tem sido usado pelo Estado, ou mesmo por grupos que detêm o poder, como um instrumento de grande eficácia para a doutrinação política, visando tornar os indivíduos menos combativos ou mais submissos. Através das artes da representação, e entre elas particularmente o Teatro, normas de conduta, valores e tradições morais, padrões de gosto têm sido disseminados de maneiras bastante sutis e aparentemente neutras. Depois de longos séculos de proibição e, até mesmo, morte de atores, a Igreja, durante toda a Idade Média, levou o teatro ao culto da missa. De dentro das igrejas as encenações ganharam as praças públicas, sempre com o objetivo de doutrinar, sobretudo o homem comum. Assim, o Teatro tem sido utilizado para atender a diversos interesses: por governantes, para difundir a sua visão de mundo, buscando tornar os comportamentos o mais próximo possível aos interesses do Estado; pelos que não querem mudanças, para criar e manter visões de mundo geralmente fundamentadas na idéia de “sofrimento individualista”; por aqueles que se opõem a governos injustos, desumanos e totalitários, para denunciar o presente e anunciar um novo futuro; e, ainda, para divertir, para ganhar dinheiro, etc .

Algumas tendências do Teatro atual em São Paulo

Atualmente, não só no Brasil, existem diferentes maneiras de o Teatro ser praticado. Alguns espetáculos objetivam ou o divertimento ou o sofrimento. É o caso daquelas comédias e dramas que falam de traições entre casais, de confusões em família, de amores impossíveis. Apesar de poder ser uma simplificação, podem ser aí inseridos os chamados dramas burgueses e as comédias de intriga. Outros espetáculos objetivam apenas impactar visualmente. O consagrado diretor teatral Antunes Filho, criticando essa tendência, afirma em vários de seus depoimentos que um camelo nessa linha teatral tem muito mais importância do que o ator ou o texto. O texto teatral funcionaria como um pretexto e o ator, como mais um adorno. Nessa tendência podem ser colocados os espetáculos ligados ao chamado Teatro pós-moderno.
Outros, ainda, bastante produzidos por muitos dos astros televisivos, objetivam o riso escandaloso, preconceituoso e debochado em relação às loiras, aos negros, aos homossexuais, aos traídos, etc. Faz parte dessa tendência o chamado Teatro besteirol. Outros espetáculos, buscando de algum modo o desenvolvimento de um Teatro popular e comunitário, escolhem assuntos próximos aos problemas das comunidades da periferia. Muitos dos integrantes desses grupos são originários dessas mesmas comunidades. Dessa tendência, podem ser citados o grupo União e Olho Vivo, dirigido por César Vieira; o grupo Engenho Teatral, dirigido por Luiz Carlos Moreira, e o grupo Pombas Urbanas, dirigido por Lino Rojas. Outros, montados a partir de textos que, de diferentes modos, podem ser inseridos no vulgarmente chamado “papo cabeça”, têm o mérito de, pelo menos, inquietar, provocar e fazer o assunto continuar depois de as cortinas terem descido. Trata-se de uma tendência na qual os artistas têm compromissos estéticos concretos com a obra, tanto na forma quanto com relação ao seu conteúdo e, sobretudo, com relação a uma determinada pesquisa de linguagem. Apesar de significativas diferenças, tanto estéticas como de linguagens, e, ainda, de alvos e de alcance político, podem ser inseridos nessa tendência, especificamente no caso do Teatro praticado na cidade de São Paulo, o C.P.T. – Centro de Pesquisa Teatral, iniciativa do Sesc São Paulo, sediado no Sesc Consolação e dirigido por Antunes Filho; a Cia. do Latão, dirigida por Sérgio de Carvalho e Márcio Marciano; o Oficina, dirigida por Zé Celso; a Fraternal Cia. de Artes e Malas Artes, dirigida por Ednaldo Freire a partir de textos escritos por Luís Alberto de Abreu; o Galpão do Folias, dirigida por Reinaldo Maia e Marcos Antonio Rodrigues; Os Parlapatões, dirigido por Hugo Possollo; a Cia. São Jorge de Variedades, dirigida por Georgette Fadel; o Grupo Tapa, dirigido por Eduardo Tolentino; o Teatro da Vertigem, dirigido por Antônio Araújo; a Cia. Fábrica São Paulo, cujos últimos espetáculos têm sido dirigidos por Robert McCrea; a Cia. Pia Fraus, com um trabalho de criação e direção coletivas, e a Cia. Trucks Teatro de Boneco, dirigida por Henrique Sitchin.

Novas Formas de Olhar – olhares simbólicos

Já vimos, logo no início do texto, que a essência do Teatro compreende o ator, o texto e o público. Vimos, também, que a arte é uma linguagem e uma forma de expressão e de comunicação em que os significados são construídos por meio de símbolos. Nesse processo simbólico, os artistas desenvolvem um trabalho de recriação tanto da realidade quanto das relações humanas, que não são percebidas do mesmo modo por todos os indivíduos. Carregada de idealização, a arte ajuda na construção visionária (imaginada) de “novos olhares sobre a realidade”. A esse processo, quase sempre subjetivo e pessoal, dá-se o nome de “reconstrução simbólica”. No dicionário, símbolo aparece como “aquilo que, por sua forma ou sua natureza ou por um princípio de analogia, representa ou substitui outra coisa”; a balança como símbolo da justiça, água como símbolo da purificação. Pode significar, também, “elemento descritivo ou narrativo suscetível de dupla interpretação, associada quer ao plano das idéias, quer ao plano real”; e, ainda, alegoria, comparação, metáfora. Pode parecer difícil, mas o que se tenta dizer aqui é que cada indivíduo pode analisar uma obra teatral – que é sempre simbólica – de modos os mais diferentes, buscando entender ou, pelo menos, imaginar seus diversos significados. Uma série de fatores podem ajudar ou dificultar a análise de um espetáculo teatral. Ao se analisar um espetáculo deve-se evitar expressões como: “Gostei!”, “Não gostei!”, “Não entendi nada!”. É necessário lembrar que o espetáculo é o resultado de um trabalho coletivo e complexo, bastante diferente de um objeto como uma calça, um sorvete, um bife. É possível comentar um espetáculo por diversos aspectos. Pode-se falar do texto, do trabalho dos atores, da trilha sonora, etc. Ajuda bastante quando se tenta separar todas as coisas.

Análise do espetáculo teatral a partir de seus elementos essenciais.

Primeiramente, sempre que for possível, deve-se procurar saber mais sobre o espetáculo. Caso não se tenha tido acesso a nenhuma informação, ao chegar ao teatro podem-se ler os materiais sobre o espetáculo que, normalmente, estão afixados, ou o programa, que, muitas vezes, é gratuito. Saber antes alguma coisa sobre o espetáculo pode ser bastante interessante. Com relação ao texto, pode-se começar indagando sobre o que ele fala. Tomando-se como exemplo
Romeu e Julieta, de Shakespeare, ele fala das dificuldades que dois jovens que se amam enfrentam para ficarem juntos. A impossibilidade determinante para o amor não acontecer deve-se à rivalidade entre as suas famílias. Continuando a indagação, em relação ao seu conteúdo, que ponto de partida ele toma? O assunto é priorizado tomando como protagonistas os desejos e necessidades dos dois jovens. Como as razões das personagens são apresentadas e desenvolvidas? Os jovens são obrigados a praticar uma série de ações que culminam na morte de ambos, por intransigência e cegueira de seus pais. De que modo o assunto do texto se liga aos interesses pessoais de cada um e ao momento em que se está vivendo? À semelhança da sociedade de Verona, onde a história dos jovens se passa, o poder proibitório dos pais ainda existe? Considerando aquele contexto histórico (séculos XVI e XVII) em relação ao nosso, os mais velhos continuam determinando o destino dos jovens? Famílias brigadas ou inimigas conseguem ver com olhos diferentes um rela-cionamento amoroso entre seus filhos? Nos dias de hoje, um jovem ainda é capaz de “morrer por amor?” Em que medida, a partir do assunto selecionado pelo autor, conseguimos entender melhor a realidade da peça ou nossa própria realidade? Apesar de o texto de Shakespeare ter sido escrito em 1594-5, a mentalidade e o comportamento no século XXI ainda guardam resquícios daquela época? Com relação ao trabalho de ator Pode-se analisar alguns aspectos do trabalho dos atores. Como os atores apresentam as personagens? O ator consegue emocionar quando a personagem sofre algum padecimento qualquer? Consegue fazer rir quando a personagem se envolve em alguma confusão? Se o ator, por exemplo, está fazendo o papel de um velho, e para convencer pinta o cabelo de branco, usa maquiagem, ele consegue convencer de que é um velho? Como gesticula? Como se movimenta? Existe uma verdade simbólica no que ele apresenta ou é exagerado? Como o ator fala? É possível entender suas palavras? Suas frases são claras do começo ao fim? Ele consegue falar de modo que todo mundo o ouça?

Com relação ao espetáculo

Não é uma questão relevante perguntar se no espetáculo a que se assiste há atores famosos de televisão. Também não o é perguntar sobre as opções sexuais de seus ídolos. Não tem sentido dizer que fulano é o maior ator de Teatro se você nunca o viu em um trabalho no palco. Também é incoerente dizer que fulano é o maior autor do teatro brasileiro se você só assistiu a uma minissérie dele adaptada para a televisão. Quando se tem a oportunidade de participar de um debate, uma das primeiras questões pode estar ligada à escolha do texto. Por que e por quem aquele texto foi escolhido? Como o conjunto de atores trabalha? Existe uma certa unidade de interpretação entre eles? Como eles se deslocam no espaço? Quando os atores estão em conjunto, como eles se organizam pelo espaço? As imagens que aparecem no espetáculo são bonitas? Que função teriam as imagens criadas? Como é o cenário. Bonito? Prático? Simbólico? Dentro do cenário, os atores conseguem se movimentar com facilidade? Demonstram estar à vontade? O cenário apresenta alguma situação de risco? Se apresenta essa situação de risco para o ator, será que isso seria mesmo necessário? Há no cenário algum material ou cor que chama a atenção? Qual se destaca mais que as outras? E os adereços usados em cena, são realistas ou fabricados especialmente para o espetáculo? Os adereços são construídos com algum tipo de material específico? Têm cores diferentes? Semelhanças? Quando há música nas cenas, como elas aparecem? Que importância tem a música para se entender melhor as cenas ou as personagens? Quando há música ao vivo, os músicos ou atores tocam bem os instrumentos? O figurino e a maquiagem ajudam a entender melhor a história? Eles são ligados à realidade? São simbólicos? Se simbólicos, que tipo de alusão eles fazem? Os atores demonstram se sentir bem com eles? Como a luz é utilizada no espetáculo? Que função teria a luz? Simbólica? Emocional? Temporal,
indicando passagem de tempo? É prática, por exemplo, para a troca de cenário, maquiagem ou figurino? Quais são as cores diferentes de luz que aparecem no espetáculo? A opção por cores diferentes teria alguma função? Em relação ao espetáculo, algumas questões subjetivas podem ser propostas. Clarice Lispector, uma das nossas maiores escritoras, afirmou certa vez: Não se preocupe em “entender”. Viver ultrapassa todo entendimento.

Um de nossos maiores poetas, Carlos Drummond de Andrade, escreveu:

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
(...) Convive com teus poemas antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros.
Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume com seu poder de palavra e seu poder de silêncio.
(...) Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível que lhe deres:

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